O reitor da Unicap (Universidade Católica de Pernambuco), padre Pedro Rubens Ferreira de Oliveira, participou da solenidade de entrega do relatório final da Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara, no dia 25 de setembro. O evento, presidido pelo governador de Pernambuco, Paulo Câmara, contou com as presenças do vice-governador, Raul Henry, e do prefeito de Recife, Geraldo Julio, além do presidente da Comissão, Fernando Coelho, demais membros do colegiado, deputados federais e estaduais, secretários, militantes pernambucanos vítimas da repressão e familiares de mortos e desaparecidos durante o regime militar.
Entre os parentes de pessoas que foram afetadas pela ditadura estavam João Vicente Goulart, filho do ex-presidente João Goulart, deposto pelo golpe militar de 1964; José Almino de Alencar Silva Neto, filho do ex-governador Miguel Arraes, também deposto pelo Exército brasileiro em 1964; Maria Cristina Capistrano, filha do dirigente do PCB (Partido Comunista Brasileiro) desaparecido em 1974, David Capistrano; Mariluce de Souza Moura, ex-presa política e viúva de Gildo Macedo Lacerda, dirigente da APML (Ação Popular Marxista Leninista) que foi morto no Recife; e Tessa Moura Lacerda, filha de Gildo Macedo.
Um momento que emocionou a todos os presentes foi quando o cerimonialista leu os nomes dos 51 mortos e desaparecidos políticos durante o período de repressão. A cada nome lido, o público respondia: “presente”. Maria Cristina Capistrano (foto), que falou em nome dos familiares das vítimas da ditadura, afirmou ser necessário continuar cobrando do Estado brasileiro respostas. “Na maioria dos casos, não conseguimos chegar nem perto das respostas, muito menos dos restos mortais”, pontuou.
Criada pela Lei 14.688, de 1° de junho de 2012, sancionada pelo ex-governador Eduardo Campos, a Comissão torna público, depois de quatro anos e meio de atividades, o relatório que trata das graves violações de Direitos Humanos ocorridas, entre 1946 e 1988, por motivação política em Pernambuco ou contra pernambucanos em outros territórios. Torna público também as circunstâncias e estruturas em que ocorreram, atuando de acordo com os fundamentos da Democracia e do Estado Democrático de Direito e recomendando a adoção de políticas públicas que assegurem a efetivação do direito à memória e à verdade histórica. O relatório foi dividido em dois exemplares, reunindo mais de 70 mil documentos. Para a sistematização de todo o trabalho, foram colhidos um total de 157 depoimentos em 50 sessões públicas e 40 reservadas.
O primeiro volume contém textos informativos sobre como foi planejado o trabalho da CEMVDHC (Comissão Estadual Da Memória E Verdade Dom Helder Câmara), desde sua criação, organização, planejamento estratégico e metodologia; além dos relatos das histórias de vida e as circunstâncias das graves violações cometidas contra 51 mortos e desaparecidos políticos, vítimas da repressão, com biografias sistematizadas por Organização Política.
Já o segundo volume, trata das dificuldades da construção da democracia no Brasil e da repercussão desses fatos em Pernambuco; da intervenção do capital externo nas eleições de 1962; e da marcha e concretude do golpe militar: o desmonte da “intervenção planejada” e a repressão em Pernambuco. O relatório expõe, ainda, as graves violações aos direitos humanos em Pernambuco nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e nos meios sociais urbanos, nos meios culturais e educacionais, nos meios de comunicação e no âmbito das religiões.
Para o reitor da Unicap, os processos de memória e verdade são indispensáveis à consolidação democrática. “O Brasil, infelizmente, tardou em fazer e, de certa forma, sem essa memória, sofre recuos atualmente tanto na falta de maturidade das instâncias democráticas, quanto nos fantasmas da ditadura que ameaçam uns e parecem solução para outros. Que Pernambuco honre a memória de seus filhos, conscientize as gerações presentes e não deixe nunca mais isso voltar a acontecer”, enfatizou.
Padre Pedro ressaltou, ainda, que em muitos lugares do mundo, junto com a memória e a verdade, se trabalha a “reconciliação”. Mas para ele, o Brasil interpretou mal a Lei da Anistia, abafou a verdade e, por isso, a reconciliação com a nossa história não pode ainda acontecer. “Que esse material seja um novo ponto de partida”, frisou.
Em seu discurso, o governador Paulo Câmara destacou a importância do ato histórico: “Esse é um trabalho intenso e, hoje, conseguimos ter esse relatório final, que está sendo entregue à sociedade pernambucana, tanto às pessoas que têm competência para analisar, catalogar isso na história, como também toda a nova geração pernambucana, uma vez que vamos distribuir nas escolas estaduais, para que os jovens conheçam a história, a verdade, e saibam, de maneira definitiva, que qualquer regime de exceção, que não respeita a Constituição ou a democracia é danoso ao país”, afirmou.
O presidente da Comissão da Memória e Verdade Dom Helder Câmara ressaltou que o documento é o maior trabalho e legado da Comissão para a população. “Não pudemos esclarecer tudo aquilo que desejávamos, pois muitos crimes daquela época deixaram de ser elucidados pelo decurso do tempo, e pela forma como ocorreu a transição da ditadura para a democracia do Brasil e outras dificuldades, como a morte de muitos personagens, mas cumprimos a honrosa missão que nos foi confiada, e acreditamos que estamos contribuindo para o fortalecimento das instituições democráticas do país”, pontuou.
Todo o material reunido pela Comissão está disponível para acesso irrestrito e gratuito no Arquivo Público do Estado e pelos sites www.comissaodaverdade.pe.gov.br e www.acervocepe.com.br.
Fonte: Unicap (Recife/PE)