Processo, Experiência e Serviço

O Reino de Deus como meta e, em seu horizonte, o valor do serviço simples. É como o Ir. Celso João Schneider define sua experiência. Filho caçula, o jesuíta viu sua infância ser marcada por um grave ferimento e, ainda nessa fase da vida, vivenciou a superação. Pós-graduado em Teoria e Prática Educativa e em Gestão Educacional, dedicou anos de trabalho ao apostolado educativo. Em entrevista para a 71ª edição do informativo Em Companhia, o irmão conta um pouco de sua trajetória na vida religiosa e fala sobre sua atual missão em São Miguel das Missões (RS).

1) Conte-nos um pouco sobre sua história, família, onde nasceu etc. 

Sou natural de Cerro Largo, no Rio Grande do Sul. Sou o mais novo da família. Tenho uma irmã que é religiosa franciscana em Anapu (PA) e um irmão, casado, aposentado, que mora em Blumenau (SC). Em função de uma queimadura que sofri no pé esquerdo aos 18 meses de idade, minha vida mudou de rumo. Deus não me puxou pela coxa (Israel), mas pelo pé. Aos nove anos, minha vida mudou ao fazer várias cirurgias reparadoras. 

2) Quando conheceu a Companhia de Jesus e por que decidiu ser um jesuíta? 

Conheci a Companhia de Jesus por meio de contatos com a Revista Notícias aos Nossos Amigos e do meu irmão, que foi seminarista. Na verdade, o que mais me impactou foi um jesuíta que era o capelão do hospital onde fiz minhas cirurgias. Não tive uma queda de cavalo, estilo São Paulo. Foi um processo que se desenrolou naturalmente. 

3) Como se deu a escolha pela vocação de Irmão? Quais foram as experiências mais marcantes vivenciadas durante sua formação como jesuíta? 

Para mim, a definição de Evangelho não é um conhecimento que se transmite para alguém que não sabe, mas uma experiência existencial que se começa a viver a cada dia de novo. Defino assim minha vida vocacional, sobretudo, considerando a fase conciliar que muito influenciou minha formação. Foram anos de passos no escuro; tempos de incertezas e da cristandade triunfalista se despedindo da história. 

Nos tempos de seminário/noviciado e, depois, como irmão, fui alfaiate por sete anos. Além de cortar o pano, aprendi muito nesse ofício, em termos de vida e de profissão, com meus colegas jesuítas. O valor do serviço simples estava no meu horizonte, mas jamais desacreditando de mudanças de maior valorização da atividade dos jesuítas irmãos. Mesmo como alfaiate, nunca descuidei dos estudos e das muitas leituras. 

4) O senhor trabalhou por muitos anos no apostolado educativo. Como foi esse tempo com os jovens e adolescentes nos colégios da Companhia? 

Logo após o noviciado, iniciei o meu magistério como professor de Matemática, mas ainda sendo alfaiate. Fui aprimorando a minha formação em vista de um melhor serviço aos demais. Cursei Pedagogia/Administração Escolar na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e fiz minha pós-graduação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) em Teoria e Prática Educativa. Depois cursei Gestão Educacional pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Mas os títulos são detalhes. 

Por 13 anos, desempenhei minhas funções de diretor do Colégio Agrícola de Itapiranga (SC), no entanto a atuação que mais me marcou foi no Colégio Anchieta, em Porto Alegre (RS). Fui orientador religioso da Educação Infantil, também diretor acadêmico por 14 anos, diretor-geral por dois anos e foram mais de 30 anos colaborando e coordenando o Show Musical Anchieta. Tudo isso eu resumo assim: ter como meta o Reino de Deus, servindo aos demais. Sempre me guiei tendo como base que: para influenciar as pessoas, não é necessário estar acima delas, mas no meio delas. Contemplativo na ação…

5) Os jesuítas retornam a São Miguel das Missões (RS) depois de 30 anos de ausência. Muita coisa mudou de lá para cá. Qual proposta de projeto pastoral os jesuítas levam para o povo desse lugar? Como foi a acolhida da cidade nesse retorno?

Pe. Dionísio Korbes e eu estamos chegando… Estamos auscultando a vida do povo, sobretudo, o do interior. Há poucos com muito e muitos com pouco. Não sou pastoralista e não tenho experiência no ramo; procuro colaborar, apesar dos meus limites físicos. A bem da verdade – como minha origem é missioneira –, faz mais de 15 anos que lidava com os indígenas Mbyá Guarani aqui da região. Além disso, participo ativamente em projetos diversos nas Missões: Associação dos Amigos da Trilha dos Santos Mártires (é o carro chefe da revitalização e espiritualidade inaciana aqui na região). Além disso, pretendo circular pelos 26 municípios, divulgando a espiritualidade inaciana e a história jesuíta nas escolas. Mas, se posso dizer que tenho um lema, seria este: À sombra da pandemia, lançando um olhar para além das ruínas. 

Também é de se ressaltar a participação do Show Musical Anchieta em diversos eventos culturais e religiosos nessa terra jesuítica. Tudo influenciou no nosso retorno para cá. 

A acolhida do povo foi carinhosa, mas também cautelosa. Tudo está sendo superado aos poucos. Vale o velho adágio: Estar no meio do povo e escutar as suas preocupações. 

7) Qual o seu papel no trabalho pastoral a ser desenvolvido na missão recebida? Quais as orientações que o Provincial repassou para a equipe? 

Meu papel principal aqui é atender às demandas regionais (conforme o Pe. Provincial pediu) e, na medida do possível, colaborar nos serviços paroquiais em geral. Como agora a pandemia nos distancia, é preciso ter paciência e ajudar onde é necessário. No momento, acompanho o Pe. Dionísio Körbes nas jornadas ao interior. Ao todo, são 22 locais de celebração. É uma região de belas terras agricultáveis, com seus problemas típicos… Não se deve colocar todos os ovos numa cesta só. É caminhando que se faz o caminho, ou, como dizia o missionário Pe. Montoya: aprendi mais religião (espiritualidade) no convívio com os guarani do que nos meus estudos na Companhia. “É preciso sentir o cheiro das ovelhas” (Papa Francisco).

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