O Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (SARES), iniciativa da Província dos Jesuítas do Brasil na Preferência Apostólica Amazônia (PAAM), reuniu na última quinta-feira, 29, representantes da Igreja Católica, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e dos Povos Indígenas no evento Construindo o Pacto pela vida e pelo Brasil na Amazônia.
Realizado em Manaus (AM) e transmitido pelas redes sociais, o evento chamou a atenção da sociedade para a defesa da vida, da democracia, do meio ambiente, das culturas amazônicas, mas, sobretudo, da urgência na formação de um pacto alicerçado em soluções para o bem comum.
No compromisso de fazer ecoar o Pacto pela vida e pelo Brasil na Amazônia se fizeram presentes no Espaço Loyola a representante do Conselho do Laicato da Arquidiocese de Manaus, Patrícia Cabral; o presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB, Dr. Helso do Carmo Filho; a representante da Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (Copime), Marcivana Sateré Mawé; o arcebispo metropolitano de Manaus, Dom Leonardo Steiner.
O Pacto foi assumido por diversas frentes de ação, uma delas pelo Conselho Nacional do Laicato do Brasil (CNLB), após o chamado da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) para contribuir com a mobilização. De acordo com Patrícia Cabral, foi criado um Grupo de Trabalho (GT) no qual foram indicados os representantes dos Regionais do CNLB que têm a missão de articular e gerar consciência crítica, principalmente entre os cristãos leigos, sobre as bandeiras que o Conselho propõe. São elas: vacina já e para todos; defesa do Sistema Único de Saúde (SUS); auxílio emergencial continuado; investigações relacionadas à campanha de vacinação e outros atos que impactaram princípios básicos da administração pública.
“A mobilização está acontecendo por meio de formações, em que esse GT do CNLB chama as lideranças para a formação e juntos vamos discutir, analisar e ver as realidades locais”, explicou Patrícia. A estratégia é recolher assinaturas para a carta que está sendo construída conforme esses encontros vão acontecendo. A meta é alcançar 1 milhão de assinaturas. A adesão acontece não só por parte da Igreja Católica, mas também de igrejas de denominações religiosas diferentes, que estão sensibilizadas com a causa e buscam a parceria com o Pacto.
Um documento que pede por justiça social, analisa o Dr. Helso, é um reforço à Igreja Católica de que é necessário cada vez mais conciliar fé e razão. Ele recorda a ocasião da festa de Santa Catarina de Sena, celebrada no dia 29 de abril, uma das primeiras doutoras do século XIV, para enfatizar que já naquela época, a santa buscava mostrar a necessidade dessa conciliação. Nos dias atuais, a razão está em falta e segundo o presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB, “temos que manter a nossa cidadania ativa para cobrar e para sermos na verdade instrumentos de ação.”
Ainda, para ele, a região amazônica é vista pelo Governo Federal como ‘algo periférico’ e que parte da política brasileira insiste no obscurantismo, por isso é importante que a democracia seja reforçada com a cidadania ativa e nesse momento mais do que nunca as pessoas e as instituições do Pacto ‘devem se irmanar’. Inclusive, o Dr. Helso recordou as milhares de vítimas fatais dessa pandemia, insistindo que a alta letalidade é consequência do mesmo obscurantismo proposital que Santa Catarina de Sena já percebia em sua reflexão crítica de séculos atrás. Ao final de sua fala, ele levantou a bandeira “vacina no braço e comida no prato” para todos.
Não por acaso, desde o início da pandemia, a Amazônia tem sofrido com o desmatamento. Em 2020, atingiu o nível mais alto de desmatamento dos últimos 12 anos com um aumento de 9,5% em relação ao ano anterior, sem falar da expansão da grilagem em terras indígenas e do colapso do sistema de saúde em vários estados da Amazônia brasileira, principalmente em Manaus que apresentou, sobretudo, explosão de contágio e falta de oxigênio nos hospitais. Um cenário que contribui para a violação dos direitos da natureza e da pessoa humana.
Os povos indígenas neste contexto foram bastante afetados. “O Brasil tem suas raízes indígenas e a Amazônia está cheia de sinais dessa presença dos nossos ancestrais”, disse Marcivana Sateré Mawé, completando: “uma vez que o nosso território, nossa terra, está ligada a nossa identidade é vital que não se alimente discursos colonialistas pautados numa política que nos separa, uma política que nos divide entre indígenas aldeados e indígenas em contexto urbano”.
A fala da representante do Copime é uma advertência, principalmente, ao Plano de imunização contra a covid-19. Isso porque a vacinação desse grupo prioritário foi reduzida aos indígenas aldeados e, embora o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha determinado, há um pouco mais de um mês, que o governo também priorize no plano de vacinação indígenas que moram nas cidades, a iniciativa encontra obstáculos em alguns estados e municípios.
Na ênfase que a Igreja defende a vida humana e todos os seres, o arcebispo de Manaus, Dom Leonardo Steiner, afirma que o “Brasil corre perigo não apenas quanto à saúde, mas quanto à saúde democrática, institucional e na justiça. Assim, diversas dimensões da sociedade acabam correndo perigo”. E, é diante disso que o Pacto pela Vida e pelo Brasil deseja superar certos negacionismos. Além disso, Dom Leonardo propôs apoio e seguimento no caminhar com a ciência no contexto pandêmico.
O arcebispo também demonstrou preocupação com a fome que cresce na cidade de Manaus e pediu respostas urgentes no tocante a uma ajuda emergencial. Reclamou da insensibilidade do Governo e Congresso Nacional para com as pessoas em situação de vulnerabilidade. Ressaltou ainda que “temos dificuldades para compreender como existe insensibilidade para com os pobres e insensibilidade para com a questão da justiça”.
Ao pensar no Pacto interligado aos quatro sonhos do Papa Francisco na Exortação Apostólica Querida Amazônia, o arcebispo refletiu a partir de uma ‘totalidade do existir’, da ‘visibilização da Casa Comum’, de uma real necessidade de cuidado do meio ambiente e do respeito pelas culturas amazônicas. O Pacto leva em consideração esses e outros elementos no qual a Igreja “não tem receio de participar”, afirmou.
Dom Leonardo insistiu ao final de sua fala que é fundamental “nos colocarmos juntos das pessoas que mais precisam”, pois quando se fala de vida, “estamos compreendendo toda a realidade em que nós estamos”. Assim, o Pacto pela vida e pelo Brasil deve ser visto desde o chão que se pisa no território amazônico.