
A Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) deu início, nesta segunda-feira (08), à 29ª edição da Semana Teológica. O evento, que neste ano tem como tema Jubileu da Esperança: uma agenda para a Teologia Contemporânea, reuniu docentes, estudantes e pesquisadores em torno de reflexões sobre os grandes desafios da fé e da sociedade na atualidade.
A conferência de abertura, intitulada Cartografia das crises: desafios para uma teologia contemporânea, foi conduzida por três pesquisadores convidados: o professor Sérgio Douets (Unicap), o professor Lúcio Flávio Ribeiro Cirne (Instituto Humanitas Unicap) e a professora Alzirinha Rocha de Souza (Itesp/SP). A mediação ficou a cargo do docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Unicap, Edson André Gomes.
Crise de sentido: habitar a crise como condição de futuro
Primeiro a falar, o professor Sérgio Douets destacou que a crise não deve ser vista apenas como obstáculo, mas como parte constitutiva da vida humana e da produção de conhecimento. “Viver é estar constantemente diante de rupturas e dilemas, diante da tomada de decisões. Do ponto de vista etimológico, a crise gera conhecimento, desestabiliza certezas e nos obriga a pensar”, afirmou.
Segundo Douets, a experiência cristã só se realiza plenamente quando confrontada com situações de crise. “É possível encontrar-se com a pessoa de Jesus sem colocar nossa existência em crise? É possível realmente ser cristão sem habitar a crise?”, provocou.
O docente também refletiu sobre o impacto da modernidade nas formas de vivência da religião. Se, por um lado, a secularização enfraqueceu o poder regulador das instituições, por outro, aumentou a autonomia do sujeito, que hoje “monta” sua fé de forma personalizada. “Cada um constrói sua liturgia a la carte, seu próprio magistério. Isso gera um ambiente cada vez mais fragmentado, marcado pelo relativismo, mas também por tendências fundamentalistas”, analisou.
Para ele, esse contexto coloca à Igreja o desafio de “repropor a fé em meio a sociedades órfãs de grandes utopias, mas cheias de microprojetos fragmentados”.
Crise socioambiental: a Terra como sujeito de dignidade
Em seguida, o professor Lúcio Flávio Ribeiro Cirne trouxe a perspectiva da crise socioambiental, tomando como referência o livro Há esperança para a criação ameaçada?, de Jürgen Moltmann e Leonardo Boff, além do manifesto da Comissão para a Ecologia Integral e Mineração da CNBB.
“Todos os seres do universo estão interconectados. Nada existe fora da relação. Essa é a lei fundamental do universo: a interdependência e a cooperação”, afirmou Cirne. Para ele, a visão teológica precisa superar o antropocentrismo e reconhecer a Terra como sujeito de direitos.
O professor destacou ainda que “não é a pessoa humana que é a medida de todas as coisas, mas sim a natureza”, recordando que a vida humana é apenas um momento do processo evolutivo. “A Terra é viva, a Mãe Terra é portadora de dignidade e merece respeito. O planeta pode viver sem nós, mas nós não podemos viver sem ele”, disse.
A esperança, segundo Cirne, está justamente em resgatar essa dimensão espiritual que atravessa toda a criação. “O Espírito habita todas as criaturas. Ele dorme na pedra, sonha nas plantas, desperta nos animais e sabe que está acordado no ser humano. É essa consciência que nos permite amar a vida e resistir à sua destruição”, concluiu.
Crise eclesiológica: comunidade versus massificação
A terceira intervenção (online) foi da professora Alzirinha Rocha de Souza, que tratou da crise eclesiológica. Ela relembrou que o Concílio Vaticano II já havia reposicionado a Igreja como “Povo de Deus em caminho” e não como instituição perfeita e acabada.
“Não se faz teologia unicamente com livros. A teologia deve nascer do encontro com as realidades concretas e com as dores da humanidade”, afirmou. Para Alzirinha, a teologia contemporânea precisa ser interdisciplinar e dialogar com outros saberes, de modo a responder às demandas complexas do tempo presente.
A professora chamou atenção para a necessidade de resgatar o sentido comunitário da fé, em contraposição à massificação e ao individualismo. “Igrejas de massa não fazem comunidade. A experiência cristã se dá pelos vínculos humanos, não pela adesão anônima”, defendeu.
Ela lembrou que a transmissão da fé não pode se reduzir à simples passagem de conteúdos, mas deve ser uma experiência transformadora: “O encontro com Jesus é o que constitui a pessoa de fé. A experiência é sempre um antes e um depois, um ponto de virada”.
Abertura – o momento de abertura da 29ª Semana Teológica contou ainda com uma mesa oficial formada pelo Vice-reitor da Unicap, Padre Delmar Cardoso; pelo Pró-reitor de Graduação e teólogo, Degislando Nóbrega; e pelo coordenador do curso de Teologia, Padre José Marcos Gomes de Luna.
A tarde também teve apresentações do MPB Unicap e do Instituto de Liturgia da Unicap (ILU). A programação da Semana Teológica segue ao longo da semana com mesas, conferências e atividades que aprofundam o tema “Jubileu da Esperança: uma agenda para a Teologia Contemporânea”.
Fonte: Unicap




