Experimentar Deus na vida cotidiana é tema de encontro

As várias formas de experimentar Deus na vida cotidiana foi o tema debatido no seminário Diálogos em Construção, realizado no dia 29 de julho. O evento, promovido pelo Observatório Socioambiental Dom Luciano Mendes de Almeida (OLMA), foi uma das atividades da Semana Inaciana, que celebrou o Dia de Santo Inácio de Loyola, no Centro Cultural de Brasília (CCB). O encontro contou com a participação de Mariano de Deus e Flavia Lara, do grupo Diversidade Cristã, de Ricardo Januzzi, Integrante da Comunidade de Vida Cristã (CVX), e Luciano Fazio, do Grupo de Reflexão Bíblica.

“Espiritualidade encarnada é pleonasmo”, afirmou o bilbista Paulo Ueti, facilitador no evento. O trocadilho com a figura de linguagem que indica redundância de significado é para dizer que a história de Jesus Cristo mostra que não existe experiência de Deus fora da vida concreta. “Para os católicos, a revelação de Deus não se faz num livro ou num objeto, mas numa pessoa: Jesus Cristo. Para saber o que é a espiritualidade basta olhar para Jesus”, cabe ao cristão, recordou Ueti, descobrir, a partir de sua realidade e de suas influências culturais e sociais –  os espaços para vivenciar a espiritualidade. “Como nós, que experimentamos Deus, descobrir quais os desafios que essa experiência nos leva a ‘concretar’.”

Ueti indicou alguns aspectos que podem auxiliar o cristão nessa descoberta. O primeiro ponto é a escuta. “Quem a gente escuta? Como é que Deus nos fala? Quando falo é a partir do meu lugar, do meu corpo, do meu sexo. A vida é sincrética. Temos influências de vários lugares”, apontou.

O teólogo chamou atenção para duas palavras que, na língua portuguesa, ganharam sentido negativo, mas que devem balizar a vida do cristão: perturbação e excentricidade. “O cristão precisa se sentir perturbado quando vivencia a Deus. E ele precisa praticar a sua excentricidade, não pode ser ‘normal’. Ser normal não é natural do cristão.” Outra atitude importante, disse, é contemplar. “A contemplação é indutora de mudança, ajuda a querer fazer outra coisa. As pessoas sempre saem diferente de uma contemplação, isso é metanoia (transformação espiritual)”. O terceiro aspecto é a diaconia, o serviço ao outro. A experiência de Deus, segundo ele, enche o cristão de coragem e desperta o desejo de cuidar do outro, mudando o seu lugar social.

O seminário contou ainda com o testemunho de grupos que atuam no CCB, a partir da espiritualidade inaciana. Mariano de Deus e Flavia Lara, do Diversidade Cristã, relataram a evolução que tiveram em sua relação com Deus quando encontraram uma comunidade em que foram acolhidos.  Mariano relatou que ficou surpreso quando, ao se apresentar a um grupo de pessoas, no CCB, como integrante do Diversidade por ser homossexual recebeu abraço e boas-vindas. “Sei que isso deveria ser normal numa igreja que se diz cristã. Mas, como a prática tem sido a de rejeição, estranhei o que deveria encarar com naturalidade”, disse. Ele contou ainda que frequenta a Igreja desde os 15 anos e nunca desejou sair. “Mas sempre me senti excluído ou rejeitado. Agora é diferente. No grupo Diversidade Cristã encontrei um espaço para aprofundar a minha espiritualidade, onde eu posso estar como sou”.

Flavia Lara contou que vem de uma família católica. Fez todos os ritos próprios dos anos iniciais, como primeira comunhão e crisma. “Quando descobri sobre minha sexualidade me escondi e acabei me afastando da igreja. Tentei me aproximar, mas sempre me deparava com experiências ruins. Ela conta que conheceu o CCB há dois anos, quando estava fazendo terapia. “Vi no Diversidade o espaço que eu precisava para me entender e me aproximar de Deus. Foi uma experiência inovadora com a qual até hoje me surpreendo. A gente sabe que Deus não nos rejeita.”

Segundo Ricardo Januzzi, integrante da Comunidade de Vida Cristã (CVX) Alberto Hurtado, a união e oração em comunidade impulsionam os seus integrantes a “partir para ação e criar coragem para construir projetos sociais”. Ele ressaltou que esses projetos não são apenas no âmbito da igreja, mas na vida concreta. Ele mesmo, ao definir a medicina de família como carreira profissional, fez essa escolha inspirado pela experiência na CVX. “A opção profissional tem a ver com essa perturbação. Onde estou, está a espiritualidade. Escolhi ser médico de família em comunidade carente para cuidar das pessoas. Assim é com todos os que integram a CVX”.

Depoimento semelhante fez Luciano Fazio, do Grupo de Reflexão Bíblica. Ele contou que o grupo nasceu da necessidade de alguns leigos que frequentavam a missa de compartilhar a mensagem do evangelho dominical para além da homilia do sacerdote. O grupo se encontra a cada sábado uma hora antes da missa das 19h. “Tínhamos o desejo de conhecer a Palavra de Deus pelo Evangelho, de forma dialogada com outras pessoas que tivessem afinidade e interesses comuns”, explicou Fazio. Ele contou que após partilharem as três leituras do domingo, cada leigo, a partir de uma pequena pesquisa previamente feita, se expressa sobre a percepção que tem da mensagem de Deus. Ele disse que cada um traz para a discussão as suas experiências pessoais, a partir das atividades cotidianas, onde a espiritualidade é posta em prática. Há pessoas que trabalham com migrantes, outras com trabalhadores rurais, por exemplo. “O grupo se permite pensar. Não se propõe a fazer ações sociais porque ele já é formado pela troca de experiência e vivência de fé em que cada um é enriquecido pela palavra e a palavra é iluminada pela experiência individual do outro”.

Diálogos em Construção é promovido pelo OLMA, em parceria com o CCB. A cada último sábado do mês, especialistas são convidados a falar sobre um tema que mexe com a vida política ou cultural do brasileiro. O encontro de julho pode ser assistido na integra aqui.

O próximo, previsto para o dia 26 de agosto, tratará da crise institucional no Brasil e terá a presença do subprocurador geral da república, Eugênio Aragão.

Fonte: Centro Cultural de Brasília – CCB (Brasília/DF)

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