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Pe. Luís Renato fala sobre o Princípio e Fundamento

 EE – Princípio e Fundamento

 

“O ser humano  é  criado para louvar,

reverenciar e servir a Deus nosso Senhor

e, assim, salvar-se.”

(EE 23,2)

 

A antropologia cristã apresenta o ser humano como uma criatura, dependente do Criador. Criatura de Deus não significa escravo, mas filho, amigo, companheiro, interlocutor. Feito à imagem e semelhança de Deus, o ser humano tem a possibilidade de dialogar com seu Criador e Senhor. A teologia expressa isso ao afirmar que ele é “capaz de Deus”. Karl Rahner o chama de “ouvinte da Palavra”. A mente e o coração humanos estão potencialmente abertos para Deus.

O Princípio e Fundamento (PF) foi um dos últimos textos a serem incluídos nos Exercícios Espirituais (EE). Inácio o escreveu no tempo em que realizava seus estudos teológicos em Paris (França). Ele revela certa familiaridade com a filosofia e teologia da época. Mas, por trás da sua aparente abstração, o PF tenta expressar, em palavras, a experiência inefável que seu autor fez em Manresa (Espanha), especialmente na famosa ilustração do Cardoner.

 

“Ele (Deus) nos escolheu em Cristo,

antes da criação do mundo

para que sejamos santos

e sem defeito, diante dele,

no amor” (Ef 1,4).

Toda a criação foi feita “por meio dele e para ele” (Cl 1,16). Deus criou o universo e a humanidade para poder entregar-se a nós. Nós somos os destinatários dessa imensa História de amor. E é em Cristo que esse sonho de Deus realiza-se plenamente. Ele é o Novo Adão, o Homem-que-Deus-quer, o ser humano autêntico.

Para Inácio, o homem e a mulher nunca estão sós. Chamados a viver em permanente alteridade, referência e diálogo com um Deus pessoal, vivem inseridos em um universo “criado”, que irradia a glória do Criador. Essa é fonte de alegria e liberdade para todo ser humano. Na riqueza e beleza da criação, o homem e a mulher do PF veem o transbordamento do amor do Deus trino.

Pode surpreender que Inácio não empregue no PF a terminologia do amor. O tema está implícito nas atitudes de louvor, reverência e serviço. No final dos Exercícios Espirituais (EE), Inácio o explicitará, na célebre Contemplação para alcançar amor.

 

Os EE são uma experiência cristológica

 A Santíssima Trindade ocupa sempre um lugar de destaque na vida e na oração de Inácio. Mas a visão da Trindade compreende sempre a do Filho único, “nascido do Pai antes de todos os séculos”, feito homem na plenitude dos tempos para levar a termo sua obra de salvação. Daí a prevalência da orientação cristológica na espiritualidade inaciana. Isso se verificou patente ao descrevermos o itinerário espiritual seguido pelo santo, através do qual foi-se realizando uma progressiva assimilação do mistério de Cristo.

Inácio dá um lugar especial a Jesus Cristo nas contemplações das três Pessoas divinas: Cristo é o centro da sua experiência espiritual. Ele é, antes de tudo, o “enviado” do Pai, cuja vontade busca sempre realizar; é Cristo que responde e que confirma em nome da Trindade; Ele é o “filho mediador”, que conduz os homens ao Pai: “Ninguém vai ao Pai a não ser por mim” (Jo 14,6).

Já no primeiro momento de sua conversão, verifica-se o papel preponderante de Cristo; toda a espiritualidade da Vita Christi aparece centrada sobre Jesus Cristo. Na visão do Cardoner, Jesus participa também da grande “descida e subida”; sua descida pessoal dá-se pela Encarnação e sua subida ao Pai, no mistério Pascal. Em La Storta, o Pai manifesta a Inácio a vontade de que se entregue ao serviço de seu Filho. O Pai o remete ao Filho e Este o aceita a serviço seu e do Pai.

A experiência de La Storta define sua vocação de Apóstolo. Inácio sente-se chamado pelo Pai a estar com o Filho e “estar com o Filho” não significa uma atitude passiva, mas deixar-se configurar por e com Cristo, através de progressiva identificação com o itinerário de Jesus: vida, morte e ressurreição. Por isso, a experiência de sentir-se associado à obra do Redentor expressa-se na prática do serviço. E Inácio será o homem do maior serviço divino.

 

Cristo e o Princípio e Fundamento

Dado o caráter essencialmente cristológico dos Exercícios Espirituais, torna-se inconcebível que o Princípio Fundamento não seja uma experiência fundamentalmente cristológica, já que o PF está presente, continuamente, em todos os exercícios de oração, mediante a “oração preparatória” (46) e é preâmbulo essencial do momento culminante de todo o processo espiritual, a eleição. Cristo, com quem o exercitante deve se identificar, é a realização mais perfeita do PF: a plenitude da glória do Pai e da vida dos homens se dá “em Cristo”, porque “só Cristo ressuscitado constitui o homem perfeito, cuja imagem e semelhança foi plasmado o corpo de Adão” (S. Irineu). Por sua vez, Cristo, frequentemente denominado “Criador e Senhor” nos Exercícios, é também objeto do “louvor, reverenciar e servir”.

 

O uso ordenado das criaturas (a balança)

“Daí se segue que ele deve usar das coisas tanto quanto o ajudam para atingir o seu fim, e deve privar-se delas tanto quanto o impedem” (EE 23,4).

Das duas premissas anteriores, segue-se, necessariamente, que o ser humano deve usar retamente de todas as criaturas, em ordem ao cumprimento do seu fim ─ o louvor, reverência e serviço de Deus. O mundo das coisas não está submetido ao domínio abusivo do ser humano, mas é o “âmbito da nossa adoração e serviço”27. Esse serviço e louvor de Deus manifestam-se, necessariamente, na relação harmoniosa das pessoas com a natureza.

O princípio do “tanto quanto” consiste no uso ordenado ─ fraterno e solidário ─ das criaturas. As coisas que o Pai criou são nossas. Somos filhos, mas não filhos únicos. Temos irmãos e irmãs. Podemos e devemos usar de tudo o que há em casa fraternalmente. Muitos de nossos irmãos não estão tendo chance de experimentar os dons de Deus, pela injusta distribuição dos bens que Ele criou para a felicidade de todos. O sonho de Deus ─ um mundo de harmonia e paz, sem violência, sem egoísmo, sem inveja− não está sendo realizado. A Doutrina Social da Igreja nos lembra: “Ninguém tem direito de reservar para seu uso exclusivo aquilo que é supérfluo, quando a outros falta o necessário”.

 

Indiferença Ativa / Liberdade afetiva (o pássaro)

 “Por isso, é necessário fazer-nos indiferentes a todas as coisas criadas[…]” (EE 23,5)

O termo “indiferença” (“tornar-se indiferente”) costuma ter sentido passivo, o que dificulta a imediata compreensão do conceito inaciano. A “indiferença inaciana” não é apatia ou insensibilidade, não é falta de amor ou interesse pelas criaturas. É um amor ordenado, purificado da desordem que costuma haver nos nossos afetos (“afeições desordenadas”). “Indiferente”, no sentido inaciano, significa desapegado, livre de qualquer paixão desordenada, inteiramente disponível para fazer em tudo a vontade de Deus.

As coisas criadas, boas em si mesmas, podem ser buscadas e usufruídas desordenadamente, isto é, fora da finalidade para a qual foram criadas. A pessoa, em vez de possuir as coisas, passa a ser possuída por elas. Para conhecer e escolher unicamente a vontade de Deus, é necessário libertar-se do poder de sedução que as coisas exercem sobre a nossa natureza, ferida pelo pecado. Daí a necessidade de certo despojamento ou distância crítica.

O que interessa, em último termo, não é a relação do ser humano com as coisas (meios), mas a relação dele com Deus (fim). O que se pretende é a total disponibilidade diante do único Absoluto, que relativiza todo o mais. O “sentido agudo do absoluto de Deus” (K. Rahner) deve produzir no exercitante, ao menos como desejo, uma sincera liberdade afetiva. A atitude espiritual que chamamos, talvez de maneira infeliz, “indiferença” é o reverso ascético de uma grande e radical exigência de amor. A indiferença é o caminho, não a meta.

Parafraseando Santo Agostinho, poderíamos dizer: “Dá-me alguém que ame e compreenderá esta atitude de disponibilidade radical à vontade de Deus”. Quem ama deseja estar junto ao amado e torna-se indiferente às outras circunstâncias (estar com ele no interior ou na praia, viajar de ônibus ou de avião).

 

Sobre a ilustração no Rio Cardoner, em Manresa

Em Manresa, Inácio experimentou uma intensa luta interior e também intensa iluminação espiritual. Aqui, ele ficou por quase um ano, 1522, dedicando-se à oração e à penitência. No final dessa experiência de transformação interna, que ele chamava do seu noviciado, ele sentiu-se como se tivesse nascido de novo. Dessas experiências sentidas e ruminadas, surgiram as meditações do Rei temporal, das Duas bandeiras e o seu ideal apostólico.

Rio Cardoner. O pequeno rio Cardoner, com 87 km de percurso, é um afluente do Llobregat. Contemplando demoradamente o Cardoner, Inácio teve a `exímia ilustração´, grande iluminação interior de Deus: tudo vem de Deus por Jesus e tudo volta ao Pai por Ele. Inácio teve “uma ilustração tão grande, que lhe pareciam novas todas as coisas” (Aut. 30). Por isso, no dizer de Jenonimo Nadal, sempre via o mundo em um conjunto, não parcialmente, mas na composição de uma unidade harmônica.

Nessa cidade, Inácio teve diversas experiências espirituais e também passou por profundas provações internas: desânimo, aflição e noite escura da alma. Provações, iluminações! Aqui, defrontou-se com sua sombra mais profunda, que quase o matou, mas também experimentou grandes consolações espirituais que o confirmaram no caminho iniciado.

Estando ali assentado (olhando o rio Cardoner!), começaram a abrir-se-lhe os olhos do entendimento. Em todo o decurso de sua vida, até os 62 anos de idade, não lhe parece ter alcançado tanto quanto daquela vez.

A vivência interior dessa sua permanência em Manresa proporcionou-lhe material para escrever os Exercícios Espirituais.

 

Significado do IHS

IHS (às vezes JHS) é um monograma do nome de Jesus Cristo, ou seja, um Christogram.

Origem

O monograma IHS aparece nos primeiros séculos de nossa era, a partir do nome grego de Jesus: Ιησ ούς (capitalizado ΙΗΣ ΟΥΣ), o que seria uma abreviatura. Essa abreviatura─ iota – eta – sigma ─ é IHΣ, sendo substituído pelo sigma final de S, mas permanecendo eta, do grego, por sua semelhança com o H, do latim, e como nós a conhecemos.

A partir do século VI, é a grafia errada “Ihesus”.

 

Interpretações posteriores

O esquecimento com relação à origem do monograma resultou em outras etimologias:

  • I ESUS H Ominum S alvator (Jesus Salvador dos homens, em latim).
  • I ESUS H Jerusalém S alvator (Jesus salvador de Jerusalém).
  • I n H c S igno vinces (com este sinal conquiste), criado pelo imperador romano Constantino (272-337), que afirmou que, antes da Batalha de Ponte Mílvia, tinha aparecido a sigla IHC, com sua expansão explicativa “In Hoc Signo Vinces”, referindo-se ele se converteu ao catolicismo, iria ganhar na batalha. No entanto, depois de vencer a batalha, Constantine adaptado como o símbolo lábaro (banner) com o monograma XP (ΧΡ ιστός: Khristos Cristo).
  • I H av S uffered (sofri).

 

Extensão do monograma

Devoção solicitada pelos franceses, a religiosa St. Bernard (1090-1153) com o nome de Jesus como uma representação da própria divindade, e mais tarde pelo monograma uso que fez o aristocrata italiano João Colombini (1304-1367), o eles se tornaram muito populares.

Pregadores como St. Vincent Ferrer (1350-1419) e São Bernardino de Siena (1380-1444) usado para usar isso em seus sermões, e até mesmo vincular-lo aos milagres que uniram estes sermões, que são muitas vezes acompanhados por conversões maciças e curas.

O espanhol militar e religioso Santo Inácio de Loyola (1491-1556) adotou o monograma em seu selo de superior da Companhia de Jesus (1541), e assim se tornou o emblema do seu instituto.

Iconografia

Este monograma é encontrado em numerosas pinturas e relevos, muitas vezes sozinho, porque sua simples presença já é uma representação de Jesus para os cristãos.  Além disso, muitas vezes, ele é associado com outro, também representante de Jesus Cristo, ou muito próximo a ele simbolicamente.

A cruz

Representação do paleocristianismo é muito rica e variada, muitas vezes acompanhado por outros elementos, como a cruz.  A cruz tem acompanhado o monograma tanto superior (ilustração à direita) e minúsculas, muitas vezes usando a minúscula h para simbolizar tanto a cruz através dele com um acidente vascular cerebral, especialmente utilizando para isso as letras minúsculas góticas, como na ilustração acima.

Jesus

Anexado à conexão com a cruz, deu representação monograma IHS com Jesus, muitas vezes crucificado, embora também tenha dado junto com a criança.

Os pregos

Outro símbolo do martírio de Jesus junta-se a representação do monograma cruz são os pregos, que visam a lembrar aqueles que pregaram na cruz Jesus Cristo durante a sua crucificação.  Geralmente estes pregos são representados em número de três, ficando a representação clássica da crucificação de Cristo em um prego através de cada lado, e uma terceira ambos os pés colocados uns sobre os outros.

Crismones

Ocorreu durante o românico inclusão no crismones, alegando que a presença da criança na Trindade (Pai, ​​Filho e Espírito Santo), que se juntou a este símbolo cristão, embora ambos realmente se referem ao mesmo símbolo: Jesus.

Companhia de Jesus

O monograma IHS foi adotado como um selo por Inácio de Loyola, um dos fundadores da Companhia de Jesus, que se tornou um símbolo da Societas Jesu.  Depois de Inácio em seu uso rótulo como geral ou superior desta ordem, os jesuítas muitas vezes, junta alguma luz solar que emergem do símbolo. O Papa Francisco, membro da ordem jesuíta, tem em seu monograma escudo pessoal IHS.

Pe. Luís Renato Carvalho de Oliveira, SJ

Estuda Espiritualidade e colabora nas atividades do Centro de Espiritualidade, em Bogotá (Colômbia).

 

 

Fontes:

Princípio e fundamento (EE 23): introdução, texto e comentário – Luis González-Quevedo, SJ;

Textos de Pe. Adroaldo Palaoro, SJ.

Princípio e Fundamento – José Maria Rambla, SJ – Cuadernos EIDES, n. 63 pp. 3-16

www.terraboa.blog.br/2014/05/peregrinacao-inaciana-6-22set-manresa-o.html

es.wikipedia.org/wiki/IHS

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