No dia 15 de fevereiro, o Fórum das Águas do Amazonas retomou suas atividades de mobilização, promovendo a VIII Tribuna das Águas na Praça Heliodoro Balbi. Diversas organizações da sociedade civil participaram do evento, e muitas delas decidiram fazer uso da palavra na tribuna: Associação dos Docentes da Universidade Federal do Amazonas (Adua), Centro MAGIS Amazônia, Comissão da Ecologia Integral, Instituto Sumaúma, Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (Sares), Universidade Federal do Amazonas (Ufam), entre outras. Também se manifestaram na tribuna o vereador José Ricardo (PT) e o artista musical Djedah.
O evento foi realizado em parceria com o Centro Associativo Amigos da Praça (CAP) e contou com o apoio da Associação Habitat para a Humanidade Brasil. Nesta edição, a Tribuna das Águas discutiu os desafios da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), que ocorrerá em Belém (PA) entre 10 e 21 de novembro. Entre as metas previstas para a COP30, destacam-se: redução das emissões de gases de efeito estufa, adaptação às mudanças climáticas, financiamento aos países em desenvolvimento, utilização de tecnologias de energia renovável, preservação das florestas e da biodiversidade e garantia da justiça climática.
As organizações presentes posicionaram-se sobre o evento da ONU, ressaltando a necessidade de maior envolvimento da sociedade civil nas discussões que ocorrerão em Belém. Muitas demonstraram preocupação com a forma de organização, apontando dificuldades para a participação popular, já que as decisões tendem a ficar restritas a um seleto grupo de presidentes e ministros de Estado, fortemente influenciados por lobbies empresariais. Para esses coletivos, é fundamental criar estratégias de intervenção popular, garantindo que as necessidades das comunidades e povos sejam efetivamente consideradas.
Representantes indígenas utilizaram a palavra na Tribuna, relatando as dificuldades enfrentadas pelos povos originários para proteger seus territórios das investidas de grandes empresários e transnacionais que buscam explorar as riquezas naturais, ignorando a voz e o modo de vida das populações locais. Muitas etnias estão ameaçadas pela invasão de seus territórios por grileiros, garimpeiros, madeireiros, mineradoras e empresas. Até mesmo o Estado tem insistido na construção de grandes estradas nessas áreas, comprometendo a preservação das florestas e rios, essenciais à sobrevivência desses povos.
Representantes de movimentos de mulheres também se manifestaram, destacando a necessidade de romper com o paradigma patriarcal que domina a sociedade ocidental e mantém as mulheres em posição de desvantagem em relação aos homens, apesar de seu papel fundamental para a sociedade e para a continuidade da vida. O paradigma vigente impede que as mulheres desenvolvam plenamente suas potencialidades nas diversas dimensões humanas e sociais, restringindo seu acesso a posições de destaque. Essa postura misógina impede a sociedade de ampliar sua visão de mundo e reconhecer valores intrínsecos à natureza e à diversidade.
Essa incapacidade de perceber o mundo a partir de olhares e sensibilidades distintas leva a sociedade ocidental a instrumentalizar a natureza, adotando posturas agressivas e predatórias contra o planeta. Nessa lógica, tudo pode ser transformado em mercadoria para movimentar o mercado e beneficiar a economia, independentemente dos danos causados ao ecossistema e às populações que dele dependem. As mudanças climáticas são fruto dessa racionalidade instrumental, característica da sociedade moderna e contemporânea, sendo necessária uma profunda transformação cultural que permita encontrar soluções adequadas para as crises socioambientais que enfrentamos.
A transformação da natureza em mercadoria também é visível em Manaus (AM), por exemplo, com a privatização do abastecimento de água e do esgotamento sanitário. O baixo desempenho da concessionária indica que o objetivo central não é atender as comunidades, mas gerar lucros para empresários e investidores. O aumento excessivo das tarifas deixa clara essa prioridade, dificultando o acesso de um contingente significativo de pessoas, sobretudo as mais pobres, a esses serviços essenciais. A omissão dos poderes públicos diante dessa realidade é preocupante, pois evidencia a predominância da lógica de mercado sobre as instâncias da sociedade e do Estado, agravando a vulnerabilidade das populações.
A COP30 precisa questionar as agressões sofridas pela Amazônia, resultantes do aumento da exploração irracional dos recursos naturais, da violação dos direitos básicos de seus povos, da expansão do desmatamento às margens das grandes estradas, das investidas contra a biodiversidade local e da poluição dos rios causada pelo garimpo ilegal e pela ação destrutiva das mineradoras. Caso a COP30 não apresente soluções sustentáveis que partam da escuta dos povos amazônicos, corre o risco de se tornar mais um evento sem relevância, incapaz de gerar impacto positivo na vida da humanidade e do planeta.
As organizações presentes na VIII Tribuna das Águas, por meio de seus depoimentos, reafirmaram o desejo de ter voz e vez na COP30. Há uma percepção generalizada de que os participantes oficiais do evento não estão alinhados com as necessidades reais das populações, pois atuam em contextos dominados por bancos, transnacionais e agências financeiras. As lideranças alertaram que as decisões não podem ser tomadas sob a ótica exclusiva da lucratividade, desconsiderando a vida concreta dos povos e suas demandas legítimas. Os desastres socioambientais cada vez mais recorrentes e as urgências climáticas não serão resolvidos sem uma mudança profunda de paradigma, que coloque a natureza e os povos no centro das decisões e lhes assegure o devido respeito.
Fonte: Fórum das Águas




