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Pe. Arturo Sosa, SJ, faz discurso de final de ano

Pe. Arturo Sosa, SJ, em conversa com um grupo de comunicadores em Roma (Itália)

O Superior Geral da Companhia de Jesus, Pe. Arturo Sosa, SJ, realizou um discurso de final de ano, no dia 14 de dezembro, durante uma conversa com um grupo de comunicadores, em Roma (Itália). O encontro foi organizado pelo Gabinete de Comunicação e demais membros da Cúria Geral da Companhia de Jesus.

Em sua fala, Pe. Arturo compartilhou alguns sentimentos e algumas reflexões vividas ao longo de 2022, como o mundo após a experiência da Covid-19, a guerra entre Ucrânia e Rússia, o desrespeito pelos direitos humanos, trabalho incansável do Serviço Jesuíta aos Refugiados, a 36ª Congregação Geral, a criação e andamento da Comissão sobre o papel da mulher no corpo apostólico da Companhia de Jesus, a organização da participação dos jovens ligados às obras da Companhia de Jesus na Jornada Mundial da Juventude, que acontece em Lisboa (Portugal), no mês de agosto de 2023 e o Ano Inaciano 2021-2022.

Leia, abaixo, o discurso na íntegra:

“Obrigado por aceitar o convite para participar deste encontro pré-natalino, organizado pelo Gabinete de Comunicação e demais membros da Cúria Geral da Companhia de Jesus. Estamos felizes em poder agradecer o trabalho de comunicação que vocês fazem todos os dias ao longo do ano. Como em ocasiões anteriores, buscamos abrir este espaço informal de troca que não pretende ser uma ‘coletiva de imprensa’, mas uma troca de experiências e reflexões próximo ao final do ano de 2022.

Antes de ouvir seus comentários ou preocupações, deixe-me compartilhar alguns sentimentos e reflexões sobre o que vivi ao longo de um ano, que não hesito em descrever como desafiador, emocionante e que provocou mais perguntas do que respostas:

1 – Em meio a uma mudança de época histórica, cujas consequências mal vislumbramos, o mundo que emerge da traumática experiência da pandemia de Covid-19 apresenta-se mais desigual, com estruturas sociais que aumentam a injustiça, passando por importantes transformações geopolíticas e com um ambiente em processo de maior deterioração devido a decisões que não são tomadas ou são adiadas. Assim, coloca-se a questão de saber se a humanidade perdeu a oportunidade de realizar as necessárias mudanças estruturais que permitam fechar as brechas dessa injustiça que gera a pobreza: fluxos de milhões de pessoas em busca de melhores condições de vida, formas crescentes de violência e aumento da degradação ambiental.

2 – Quando menos esperávamos, estourou a guerra entre a Ucrânia e a Rússia, afetando diretamente os países vizinhos da Bielorrússia, Polónia, Moldávia, Romênia e o resto da Europa. Os nossos irmãos jesuítas presentes no território têm participado ativamente no apoio ao povo ucraniano, sustentando a sua fé e ajudando os que procuram refúgio da guerra, venham de onde vierem. Todo o corpo da Companhia colaborou com a rede coordenada pelo Jesuit Refugee Service of Europe, sediado em Bruxelas, num vasto plano de acolhimento, acompanhamento e apoio humanitário dentro e fora do território da Ucrânia. Sou profundamente grato a tantos que tornaram possível nossa contribuição para atender ao sofrimento de tantas pessoas que foram forçadas a condições de vida quase insuportáveis. Outras guerras também ocuparam a atenção das comunidades e províncias da Companhia de Jesus, como por exemplo, no Sudão do Sul, na República Democrática do Congo, na República Centro-Africana, na Síria…

3 – Os jesuítas e companheiros de missão encontram-se no meio de outras situações de risco devido à alarmante deterioração da democracia e ao flagrante desrespeito pelos direitos humanos, que ameaçam de diversas formas os povos com quem partilham a vida e ou o serviço. Poderia citar exemplos em vários continentes, mas me limito a recordar o incompreensível assassinato dos padres jesuítas Javier Campos (79 anos) e Joaquín Mora (80), juntamente com o guia turístico que se refugiou no templo, na Serra de la Tarahumara no México, em junho deste ano. Este fato permitiu chamar profeticamente a atenção para o crescimento descontrolado da violência no México. Há milhares de mortes e desaparecimentos de pessoas neste país.

4 – O Serviço Jesuíta aos Refugiados continua a multiplicar os seus esforços para enfrentar a dramática situação dos migrantes em tantas partes do mundo. A crise do Afeganistão, em agosto de 2021, com o regresso dos talibãs ao poder, foi um momento particularmente dramático que pôs à prova tanto o povo como aqueles que, ao seu lado, procuravam salvar vidas. O JRS tem mantido um esforço crescente para ir além dos cuidados primários e oferecer diferentes formas de acesso a uma educação de qualidade a milhares de crianças e jovens em campos de refugiados ou com estatuto de refugiado.

5 – A 36ª Congregação Geral, reunida em outubro de 2016, incentivou toda a Companhia de Jesus a empenhar-se na criação de uma cultura de salvaguarda de crianças, jovens e pessoas vulneráveis, como uma das dimensões cruciais da justiça social. Uma mudança cultural requer processos longos, programados e constantemente avaliados que envolvem aprender em movimento. Tem sido feito um grande esforço para que todo o corpo da Companhia de Jesus, enraizado em contextos tão diversos, com percepções muito diferentes do problema e das formas de o resolver, tenha o mesmo nível de compreensão, resposta aos casos e clareza políticas de prevenção. Todas as 69 unidades administrativas da Companhia (Províncias e Regiões), apoiadas pelas Conferências Regionais, participaram ativamente desse esforço.

Hoje, temos um mapa exato do estado de cada uma das unidades de atendimento e prevenção. Sabe-se se eles têm programas para melhorar ou consolidar o estabelecimento de ambientes seguros em escolas, universidades, centros sociais, paróquias ou outras obras apostólicas sob nossa responsabilidade. Os protocolos de proteção à criança estão sendo bem desenvolvidos em todos os lugares. No que diz respeito aos adultos vulneráveis, há um longo caminho a percorrer para nós, para a Igreja Católica e para a sociedade civil em geral. De acordo com o caminho que cada uma das unidades tem percorrido, foram estabelecidos programas para a formação dos jesuítas e de todas as pessoas que participam da missão, bem como mecanismos de avaliação e acompanhamento que lhes permitem crescer em uma nova cultura de proteção.

6 – Afirmei que estamos num complexo processo de aprendizagem contínua nesta matéria que também tem um especial impacto comunicacional. O caso que veio a público na semana passada em relação ao Pe. Marko Rupnik é um bom exemplo do quanto ainda temos que aprender, especialmente sobre o sofrimento das pessoas. Este caso, como outros, nos enche de espanto e dor, nos leva a compreender e sintonizar com o sofrimento das pessoas envolvidas de uma forma ou de outra. Coloca-nos perante o desafio de respeitar aquela dor, cumprindo escrupulosamente os trâmites exigidos pelo direito civil ou canônico e comunicando de modo a que os fatos não sejam encobertos, enquanto, iluminados pelo Evangelho e por outras experiências humanas, se abrem caminhos para a cicatrização das feridas produzidas.

Casos como o do Pe. Rupnik são da competência exclusiva do Departamento para a Doutrina da Fé, que recorre aos Superiores religiosos tanto para investigações prévias como para eventuais processos administrativo-criminais, deixando sempre a decisão final no Dicastério para a Doutrina da Fé (DDF). Neste caso, o DDF recebeu diretamente uma denúncia de excesso de limites nas relações entre o Pe. Rupnik e adultos consagrados da Comunidade de Loyola, na Eslovênia, enquanto este realizava um trabalho pastoral vinculado ao ministério sacramental. Fatos ocorridos nos primeiros anos da década de 90 do século XX. O DDF pediu à Companhia de Jesus uma investigação preliminar. Recebidas as informações e a ordem, foram tomadas as medidas cautelares proporcionais ao caso. A investigação anterior foi realizada por pessoas competentes, fora da Companhia de Jesus, e entregue ao Dicastério. Depois que o DDF estudou o dossiê e comunicou que as denúncias recebidas foram legalmente prescritas, queremos passar do nível legal para o de lidar com o sofrimento causado e curar as feridas abertas. Manter em vigor as medidas restritivas do ministério do Pe. Rupnik é um dos elementos de um processo complexo que, sabemos, leva tempo e para o qual não existem receitas pré-determinadas. Faz parte do aprendizado que a gente vai fazendo tentando não errar.

7 – Uma experiência que vale a pena compartilhar nesta ocasião é a criação e andamento da Comissão sobre o papel da mulher no corpo apostólico da Companhia de Jesus. A constatação da imensa participação de mulheres a todos os níveis dos trabalhos desenvolvidos sob a responsabilidade da Companhia de Jesus e a necessidade de aprofundar esta participação foi o motivo e ponto de partida. Os objetivos da comissão são avaliar as condições em que essa participação é realizada e propor formas de melhorá-las. A comissão é composta por seis mulheres, escolhidas por cada uma das conferências regionais (uma delas religiosa), um leigo e quatro jesuítas de diferentes províncias. Foi estabelecido em março de 2021 com um programa de trabalho de três anos.

A primeira fase foi de conhecimento mútuo dos membros da comissão por não se conhecerem previamente e a escolha da pessoa que coordenaria o processo. Viu-se a necessidade de ir além dos membros da comissão e fazer um levantamento que abrangesse a diversidade de situações em que as mulheres participam do trabalho da Companhia. Para isso, foi obtido o apoio do Instituto de Cultura Filipina, da Universidade Ateneo de Manila, com o qual foi realizado um teste piloto para os quais tópicos, perguntas…

Somente em outubro deste ano de 2022 foi possível nos encontrarmos pessoalmente aqui em Roma (Itália). Até então, todo o trabalho era feito on-line. Durante esta reunião, foi confirmada a importância da realização de uma pesquisa abrangente. Com a presença da equipe do Instituto Ateneo de Manila, está prevista a realização de uma ambiciosa pesquisa durante o ano de 2023 para, uma vez estudados os resultados, apresentar as recomendações à Companhia de Jesus em 2024. O processo seguido enche-me de esperança e aguardo com otimismo as recomendações que sairão desta comissão, para melhorar a qualidade da participação na vida apostólica do corpo da Companhia.

8 – Está também em curso a organização da participação dos jovens ligados às obras da Companhia de Jesus na Jornada Mundial da Juventude a se realizar em Lisboa (Portugal),  em agosto de 2023. Como em ocasiões anteriores, há a participação na própria Jornada Mundial e, além disso, é realizado um programa anterior em que cerca de dois mil jovens de todo o mundo participam de experiências locais de voluntariado, em comunidades do país onde a Jornada é realizada. Desta vez, serão em Portugal e na Espanha. Este é mais um sinal que alimenta minha esperança nas possibilidades de contribuir para a transformação da realidade e caminharmos, juntos, para um futuro mais justo e humano.

9 – A Companhia de Jesus também está participando ativamente do processo que prepara o Sínodo sobre a sinodalidade, a ser realizado nas duas sessões previstas para outubro de 2023 e 2024. A participação ocorre em nível diocesano, em conferências de religiosos e religiosas e em redes apostólicas. Também colabora diretamente com a Secretaria do Sínodo do Vaticano, participando das comissões de metodologia, espiritualidade e teologia. Uma contribuição específica é o Programa de Liderança Discernidora, que este ano foi oferecido em inglês, espanhol e italiano em Roma e em outros países.

10 – Quando nos encontramos no ano passado, o Ano Inaciano 2021-2022 havia começado e culminado em Loyola em 31 de julho deste ano. Devo dizer que foi uma experiência maravilhosa que superou em muito as minhas expectativas pessoais e as do grupo promotor. Tornou-se uma ocasião para estimular a criatividade das inspetorias e das obras apostólicas, que organizaram diversas iniciativas dependendo dos povos, tempos e lugares. Seu principal fruto foi renovar o desejo de continuar o processo de conversão, ao qual as Preferências Apostólicas Universais 2019-2029 que vocês conhecem nos chamam: mostrar o caminho para Deus…; caminhar com os excluídos…; acompanhar os jovens… e contribuir no cuidado da Casa Comum.

No início deste encontro, puderam conhecer algumas das experiências: as vivências do “tiro de canhão” na vida de algumas pessoas, o resumo do concurso de vídeos juvenis e o lançamento do novo App das Peregrinações Inacianas.

A vida da Companhia de Jesus é muito mais rica do que a que apresentei neste momento. A revista dos jesuítas que receberam retrata outras dimensões dessa vida e o contato direto em tantos países em que atua, pinta um quadro de muitas cores. Tudo isso enche o coração de alegria e esperança.

Muito obrigado pela atenção e interesse.”

Fonte: Jesuits Global

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